quinta-feira, 22 de novembro de 2012

NOVA CRISE NA BBC

Para quem, como eu, serviu, durante 30 profícuos anos, tão eminente Emissora é trágico, neste seu 90º aniversário, ver tão conceituado nome nas manchetes dos media mundiais, incluindo os da nossa e tão criticado nos media britânicos. Mas não só. Também por alguns dos seus próprios e prestigiados funcionários! Dentre eles o veterano renomado jornalista John Simpson que afirmou esta ser a maior crise da BBC dos últimos 50 anos. Subitamente, e depois da transmissão de um programa televisivo pela emissora britânica ITV1, em outubro último, em que denunciava o famoso apresentador da televisão, Jimmy Savile, que morrera aos 84 anos de idade, em outubro de 2011, de múltiplos e alegados crimes de pedofilia, alguns deles alegadamente praticados a raparigas jovens nos camarins da BBC Televisão, em White City (a oeste de Londres nos anos 70 e 80, depois da gravação de programas por ele apresentados. O caso, porém, não ficou por aqui. Um dos seus mais populares programas de investigação, Newsnight, apresentado no canal da BBC2, havia investigado e entrevistado alegadas vítimas do apresentador, com o intuito de o transmitir em dezembro do ano passado, ou seja, um mês depois da morte do apresentador. O programa, porém, não foi transmitido por alegada decisão editorial com base na necessidade de mais confirmações por parte da Polícia. A decisão, foi, todavia, posta em dúvida, alegando-se que a razão principal ficar-se-ia a dever ao facto de colidir com um outro, este a elogiar a vida do visado, a ser transmitido, como realmente foi, durante o Natal do ano passado. Assunto que está a ser investigado por uma entidade independente que esteve ligada à concorrente, Sky News. Enquanto decorria esta e outra investigação, esta última a concentrar-se nas alegações de abusos sexuais praticados nas instalações da BBC, a cargo de uma ex e conceituada juíza, surge outro e inesperado escândalo – a transmissão, no programa Newsnight, de uma reportagem denunciadora de uma alta personalidade política relacionada com o partido Conservador. Embora não nomeando o visado, uma alegada vítima, nele entrevistada, afirmava ter sido violada, quando garoto, numa instituição juvenil no País de Gales. Com o firme desmentido do alegado visado, aliás, mais tarde confirmado pela falsa vítima, na base de confusão de identidade, obviamente, Newsnight, e a BBC voltariam a ser foco de compreensíveis e violentos ataques. Desta vez, porém, as atenções concentraram-se no recém nomeado diretor-geral da BBC, George Entwistle, devido à sua dupla capacidade de editor-em-chefe da Corporação. Sem ter sido previamente consultado sobre tão importante denúncia, por alegadas e deficientes estruturas editoriais, perante tão enorme clamor nacional, decidiu assumir a responsabilidade, demitindo-se, o que aconteceu 54 dias depois da sua investidura e de quase 30 anos de carreira na BBC. O mais irónico, foi George Entwistle ter sido um dos mais brilhantes jornalistas encarregados do programa Newsnight. Precisamente aquele que o levou à demissão! A trama, não ficou por aqui. Como resultado outros conceituados jornalistas da BBC, uns foram suspensos e outro demitido. Esta nova crise surgiu quando a BBC se recompunha de uma outra, esta relacionada com o Iraque e o ex primeiro-ministro Tony Blair, em particular – o também célebre caso Hutton, que envolveu um inquérito judicial chefiado pelo juiz de que teve o seu nome – Lorde Hutton, em 2003. Em causa, a notícia divulgada pela BBC-Rádio 4 em que atribuía ao então primeiro-ministro a manipulação da informação do relatório de autoria dos Serviços Secretos Britânicos de que o então dirigente iraquiano, Saddam Hussein teria armas de destruição maciça que poderiam despoletar em apenas 45 minutos. Pressuposto da intervenção militar no Iraque. Com a decisão de Lorde Hutton, da infundada alegação, resultou uma das até então mais sérias crises da BBC, provocando a demissão tanto do jornalista iniciador da notícia, Andrew Gilligan, como do diretor-geral, o popular e eficiente Greg Dyke, e ainda o Presidente da Corporação, Gavyn Davies. Com esta segunda crise, a questão que abalou os sólidos alicerces de uma das mais conceituadas instituições britânicas, é o futuro da BBC, cuja estrutura hierárquica, nomeadamente editorial, começa a ser enfrentada.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

QUEM SÃO OS SALAFIS?

Nesta que é uma importante fase de ressurgimento islâmico, principalmente depois do ataque do Al Qaida aos USA, em 2009, e da retaliação destes, primeiro ao Afeganistão e, depois ao Iraque, os muçulmanos começaram a recrutar adeptos e a intensificar a sua ação em todas as partes do mundo, graças, principalmente, aos enormes fundos proporcionados quer pela Arábia Saudita, como pelo Qatar. Foi o que aconteceu com os Salafis, principalmente durante a ocupação soviética do Afeganistão em que ali afluíram. Até então obscuro e até chacoteado movimento fundamentalista, particularmente conhecido pela mera distribuição de folhetos junto às mesquitas e festivais islâmicos e conhecido especialmente pelos seus controversos costumes, radicados ao período original de Maomé e, daí, o nome salafi, que significa “os predecessores”. Oriundos dos Sunni, que juntamente aos Shiitas, constituem os dois principais troncos do islamismo, o Salafismo, que não passava de uma filosofia, uma forma de vida, portanto sem qualquer liderança hierárquica, pelo que os seus aderentes não seguem, nem obedecem a uma simples figura, mas dependem e confiam nos escolásticos, antigos e modernos sobre a sua conduta. Para os Salafis, a vida é demasiado séria, pelo que não há lugar para o que consideram frivolidades, como a mais do que comum música, o cinema, a televisão ou a maioria de quaisquer diversões, como é o caso das civilizações ocidentais. O seu lema é o regresso às raízes e à emulação da austera piedade do Profeta Maomé e aos seus primitivos seguidores. Até recentemente, os Salafis não estavam muito interessados em política ou em qualquer forma de governo, democrático ou ditatorial, uma vez que, para eles, Deus, ou Alá é soberano. Porém, devido à acção e radicalização de um dos seus principais membros, Ben Laden, o movimento assumiu nova posição, mas pior, violência. A mais notável ação de terrorismo, encetada por Salafis, ou melhor, pelo seu braço, Ansar al-Sharia, foi o ataque e morte do embaixador americano, J. Christopher Stevens, assim como três dos seus acompanhantes, no consulado americano de Bengazi, na Líbia, no início de setembro de 2012. A sua agressividade repetiu-se no Paquistão, no dia 21 do mesmo mês, declarado feriado oficial para dia de protesto, encorajando motins que levaram à morte pelo menos 25 pessoas. A notória radicalização foi o objetivo dos Salafis que levou virtualmente todo o Paquistão a um espetro político de vários graus para a direita. Mas não apenas. Na decorrente e trágica convulsão da Síria, com Salafis a emergir de todos os cantos do mundo muçulmano, dão nova dimensão à luta contra Bashar al Assad, caracterizada por um novo factor - o sectarismo. Este fenómeno, provocou um verdadeiro terramoto em todo o mundo islâmico ao ponto do próprio presidente tunisino, o liberal Moncef Marzouki, declarar que “estamos a lidar com um grande perigo, uma verdadeira ameaça”. Na realidade, acrescenta que o “Salafismo é como um cancro. Quanto mais retardarmos, mais extremamente difícil será curá-lo”. Aponta a revista TIME (8 de outubro de 2012), que “se os governos democraticamente eleitos do Egito, Líbia, Tunísia e Iémen representam o florir da Primavera Árabe, os recém e afirmativos Salafis são ervas daninhas a dominar o terreno fertilizado pela livre expressão, mas pobremente cuidado por fracos governos.” Por isso, alerta para o facto de que, embora muitas capitais do Ocidente estejam de sobreaviso, isso não chega. Se o seu alastramento não for devidamente atacado, os “Salafis, ao forçarem este tipo de islamismo, puritano e intolerante (…) sufocarão o despertar das novas democracias…”! O melhor e mais recente exemplo é a súbita quase ocupação de metade de um dos mais liberais estados e centro de cultura africanos – o Mali.