quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

EFEMÉRIDE DO “MAIS NOBRE MONUMENTO INGLÊS DE PROSA

A versão da Bíblia em Inglês, conhecida por King James Bible (Versão do Rei Tiago) – 1566-1625, ou Versão Autorizada (Oficial), também conhecida pelo “mais nobre monumento de prosa Inglesa”, permanece, através dos quatro séculos agora comemorados, como o mais importante clássico tanto da religião como da literatura inglesas.

Profundamente religioso e, como bom Escocês da época, católico como a mãe, a fatídica Rainha Mary, vítima de Isabel I, ao suceder-lhe, em 1567, ficou conhecido por Tiago VI. Só depois da morte de Isabel I, de Inglaterra, a última baluarte da poderosa dinastia Tudor, a quem se deve a dissensão da Igreja Católica e a fundação da Igreja Anglicana, que desde então tem o/a Monarca Inglês(a) como Chefe, conhecida e poderosa inimiga da família de Tiago, este sucede-lhe, surpreendentemente de uma forma pacífica. Quando a história era pródiga em conflitos e guerras entre as duas nações, James une as duas coroas, como Tiago I, dando, assim, lugar à dinastia jacobina. Reunido e chefiando o seu clero no Palácio de Hampton, no sul de Londres, que a justificar a sua supremacia real de divinamente eleito se sentava num púlpito superior, com o supremo clero a seus pés, foi ali que no seu ensaio “Basilikon Doron”, instilou ao filho mais novo e seu sucessor, o igualmente fatídico Carlos I, os seus princípios e convicções. Aliás, nesta vetusta Câmara, conhecida por Great Watching Chamber, James I, no início do seu reinado e pressionado pelas remanescentes tensões herdadas de Isabel I, entre Puritanos (Ortodoxos) e Conformistas (bispos anglicanos), os primeiros apresentaram uma petição, quando o Rei se dirigia de Edimburgo para Londres para assumir o Trono, solicitando que pusesses fim à confissão e práticas dos segundos, consideradas por eles inaceitáveis. Presentes em tão solene conclave, os defensores das partes em disputa: os bispos, representados pelo Bispo de Londres, Richard Bancroft e Lancelot Andrewes e, os Puritanos, pelo seu dirigente máximo, John Rainolds, que perante a premissa dos oposicionistas,“Sem bispos não há Rei”!, enfrentou difícil tarefa. Perante tão promissor, mas acrimonioso debate, o Rei, reputado teólogo, deleitou-se! Durante a acesa contenda, Rainolds também académico eminente, procurando minar a versão bíblica dos Bispos, propôs ao Rei uma nova tradução, visando a versão de Genebra, então prevalecente, favorável aos pontos de vista dos Puritanos. O Rei acedeu concordando que as versões existentes tinham defeitos, particularmente a favorecida pelo proponente que o Rei considerou como a pior de todas! Coube a Richard Bancroft elaborar as regras da tradução, aprovadas pouco depois pelo Monarca. Para o efeito, serviu-se de seis grupos de tradutores baseados em Oxford, Cambridge e Westminster, que imediatamente deram início à tarefa que, um ano depois, partilharia da efeméride que visava a morte do Rei, na Câmara dos Comuns, com a abortada Conspiração do traidor Guy Fawkes, a 5 de Novembro, e, assim, tentar liquidar a monarquia de então. Como os Homens são para os verdadeiros momentos, James I notabilizou-se como extraordinário homem de Estado. Foi neste vasto cenário, que traumatizou o País inteiro, que surgiu a nova versão de uma Bíblia que uniria o dividido país, povo e igreja! Baseada na até então credível versão diretamente do Hebreu, de William Tyndale (1492-1536), terminada no ano da sua morte. De salientar que um dos grupos de tradutores baseou-se na sala da Torre do Colégio de Corpus Christi, em Oxford, local predileto do Presidente de então e iniciador da ideia da nova versão, John Rainolds. Desde o seu lançamento, há quatro séculos, a Bíblia do Rei James, além de inicialmente unir povo e Igreja, ligou, reforçou, igualmente, a língua inglesa, não apenas na metrópole, como no vasto e antigo Império, em cujos países atualmente independentes continua a ser referência, não obstante as várias e novas versões.

A TODOS OS LEITORES E SUAS FAMÍLIAS UM MARAVILHOSO ANO REPLETO DE CONSECUÇÕES E ALEGRIA

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

DAVID CAMERON E A EUROPA

A que, para alguns, foi surpresa a atitude de David Cameron, para aqueles que acompanham de perto – e vivem – a vida, idiossincrasias e problemas britânicos, principalmente aqueles que o fazem quase há 50 anos, não o poderá ter sido!

A atitude assumida pelo primeiro-ministro britânico em Bruxelas, na madrugada de 8 passado, resultou do que ocorreu no passado mês de Novembro na Câmara dos Comuns, aquando da votação da moção imposta pelos eurocéticos do Partido Conservador. Embora com a esperada vitória final de 372 votos (111 a favor da moção e 483 contra), a surpresa, porém, foi a revolta final do número de deputados do seu próprio partido, e, portanto, perigoso desafio à liderança de Cameron, em que 81 colegas votaram a favor da moção e contra a disciplina partidária, e outros 15 abstiveram-se. Fica bem patente que enquanto na crítica fase do governo de John Major, no início dos anos noventa, em que o assunto ameaçava o próprio futuro da liderança Conservadora, e em que o número de rebeldes era apenas 41, a UE continua, e pode agravar, o futuro de um partido, ele próprio, sob a tutela de Edward Heath, que conseguiu a desejada adesão em janeiro de 1972. Perante tamanhas pressões e afim de aparentar – ou demonstrar – que algo estava a fazer e aparentar corresponder às pressões da sua franja eurocética, o dirigente Conservador tentava passar “recados” e pressões sobre a necessidade da estabilidade do euro, nomeadamente a Angela Merkel e Nicholas Sarkozy, que segundo ele, embora o seu país dele não faça parte, mas insistia que a economia do Reino Unido seria afetada, recusando também a participar financeiramente nem no proposto Fundo de Estabilidade do Euro, nem através de fundos do FMI, David Cameron cria, assim, desnecessária guerra, principalmente com a Alemanha, cujo ministro das finanças, Wolfgang Schauble, ironicamente responde que o Reino Unido não terá outra solução que, brevemente, aderir ao euro!

Na madrugada de 8 de dezembro, na cimeira de Bruxelas, rebentou a inesperada bomba: o abandono de David Cameron e do seu país das negociações sobre novas medidas de reforço do euro, o que nunca acontecera antes, mesmo durante a renitente Margaret Thatcher. A pretexto de obter isenções na anunciada cláusula de se taxar os bancos, que segundo o primeiro-ministro britânico prejudicaria a “City” de Londres, cujo rendimento no PIB nacional é entre 7,5 e 10%, com consequências de, igualmente, a possível perda de milhão e meio de postos de trabalho, David Cameron, abandonou as negociações, defendendo na Câmara dos Comuns, no seguinte dia 12, que o fez – e voltaria a fazer no futuro – sempre que “os interesses nacionais o exigissem”. Esta inédita atitude, porém, foi fortemente criticada não só pelos principais órgãos britânicos da comunicação social, e nomeadamente o favorável The Economist, com exceção dos habituais xenófobos, nomeadamente o The Sun, The Daily Mail, The Daily Express e o The Daily Telegraph, que aplaudiram o ato do chefe do governo, como, e muito principalmente, pela oposição Labour, que acusaram o primeiro-ministro de, por razões pessoais de liderança, a fim de aplicar os 96 eurofóbicos do seu partido, ter isolado o país e pôr em risco o seu futuro e aspirações político-comerciais. Outra interrogação, e esta igualmente importante, é o futuro da coligação, em que os Liberal-Democratas, favoráveis à União Europeia, principalmente as figuras de charneira, como o seu ex dirigente e atualmente Lorde Paddy Ashdow, começaram a criticar e a separar-se da decisão dos seus parceiros Conservadores. Neste contexto, foi particularmente notada a invulgar ausência no debate dos Comuns, do dia 12, do vice-primeiro-ministro, Nick Clegg que habitualmente se senta ao lado do primeiro-ministro. As perturbações no seio da coligação, em relação à política anti-europeia dos Conservadores, acentuam-se pelo que o vice-primeiro-ministro insiste em tomar as rédeas do que afirma “regresso às negociações” e ao “seio da União Europeia”. A curiosidade é saber se o vai conseguir, quando o seu colega de chefia do governo foi obviamente muito aplaudido principalmente pelos eurocéticos que desafiaram a sua liderança!

domingo, 11 de dezembro de 2011

AS INEGÁVEIS VANTAGENS DA UNIÃO EUROPEIA

A vivência de quase meio século num país erradamente apelidado de euro-fóbico, mas mais apropriada e tradicionalmente insular, garante-me alguma autoridade para falar sobre este importante tema. Os conhecidos euro-fóbicos, tradicionalmente da extrema direita do partido conservador britânico por não terem um tema político suficientemente importante para se debaterem e serem suficientemente conhecidos na importante opinião pública, insistem na sua romântica insularidade e pequenês, não se preocupando de pôr em causa a segurança política do seu partido, mas, pior, quando governo, como foi o caso do chefiado por John Major, particularmente em 1992, levando o então primeiro-ministro ao desespero, classificando-os de “ filhos da pxxa”. E embora o número tenha aumentado, principalmente graças a uma imprensa favorável. esquecem-se, por exemplo, na insistência daquele grande homem que dizem reverar, chamado Winston Churchill no seu importante e revelador discurso, em Zurique, em 19 de Setembro de 1946, em que propunha uma União Europeia que ligasse para sempre a França e a Alemanha. Além disso, acrescentou que, embora a Grã-Bretanha preferenciasse os laços atlânticos, ou seja, o relacionamento especial por ele criado entre o seu país e os Estados Unidos da América (EUA), o Reino Unido estaria para sempre ligado à Europa. Por ela lutou sacrificando o império, centenas de milhar dos seus filhos, e a própria falência do país pondo em jogo o futuro do seu povo a favor de uma Europa livre.
Foi o espírito de Churchill, que levou outros grandes homens do Continente, testemunhas e vítimas das agruras devastadoras da guerra que, por causa dela e embora por razões económicas, devido às vantagens e escassês do carvão e do aço, a formarem uma aliança, génesis do que, mais tarde, viria a ser Mercado Comum iniciado pelo Tratado de Roma, em 1957. Embora convidado a aderir, mas duvidoso de sucesso, encorajado pela neutralidade de países como a Áustria a Suíça, o governo britânico de então declinou, preferindo, mais tarde, formar outra instituição, de que o nosso país foi membro, a EFTA. Porém, e reconhecendo o seu erro, foi um primeiro-ministro Conservador, Harold McMillan que, em 1963, tentou aderir, mas devido ao ressentido e orgulhoso general de Gaulle, então Presidente da influente França, tal tentativa foi duas vezes frustrada. Mas como não há duas sem três, à terceira, o então primeiro-ministro, Edward Heath, levou, finalmente, o seu país a aderir ao Mercado Comum, em Janeiro de 1973, fazendo do Reino Unido um dos seus principais membros, embora, mais tarde, principalmente aquando do Tratado de Maastrich, o então primeiro-ministro, John Major, sob intensas pressões internas, invocou – e conseguiu – até então inéditas importantes exclusões, que mais tarde o governo de Tony Blair voltaria a invocar em relação à adesão ao euro. E, Portugal? A adesão do nosso país em 1986, embora impreparado, especialmente devido a uma economia deficiente em relação a outros países membros mais desenvolvidos, foi mais uma questão política, invocada e aceite para a consolidação da sua até então débil democracia. A partir de então, começou a beneficiar do Fundo de Coesão, arrecadando importantes e vastas verbas. Foram, por isso, enormes os benefícios que os políticos de então decidiram primeiro, e bem, canalizar e beneficiar as débeis infra estruturas, ignorando ou adiando áreas da economia que gritavam pela diversificação e competitividade. Nessa altura, obviamente, ninguém questionava a adesão. Antes pelo contrário! Ficar de fora, nunca! O mesmo sucedeu em relação à adesão ao euro, quando persistiam os problemas económicos e as enormes diferenças entre outros países membros. Tanto ao nosso país, como à Espanha, mas principalmente `à Irlanda, a adesão ao então Mercado Comum representou uma enorme e inquestionável vantagem. Prova disso, foi principalmente os países da antiga União Soviética, que depois de se tornarem independentes, procuraram imediatamente aderir, tornando-se membros entusiásticos. Indubitável e independentemente das vantagens económicas, a UE tem sido um elo de coesão entre países até então inimigos, reforçando a paz entre si. Embora acusada de deficiência democrática, facilmente se esquece que, independentemente de um executivo, reconhecidamente burocrático, as decisões principais são apenas tomadas pelo Plenário composto pelos chefes de governo e presidentes eleitos dos países membros. Se precisa de reformas e liderança? Claro, especialmente agora com a crise do euro em que, possivelmente, se procurarão novas medidas de maior integração política e fiscal.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Madagáscar, Paraíso em Vias de Extinção

Madagáscar, ou, para Camões (Lusíadas Canto X, 39 e 137), Ilha de São Lourenço, a mais antiga e quarta mais extensa ilha do mundo, com 587,051 km2 de superfície, situada no Estreito de Moçambique, e descoberta em 1500 pelo navegador Português Fernão Soares, como o Poeta cantava “Onde sai do cheiro mais perfeito /A massa , ao mundo oculta e preciosa”. Essa massa por muito tempo oculta e preciosa, é atualmente, um paraíso em vias de extinção devido a vários fatores – pressões populacionais (mais de 20 milhões com o aumento anual de 3%, uma das taxas de natalidade mais elevadas da África), pobreza, na média um euro e meio por dia, e turbulência política – mas sobretudo à pilhagem e rapina humanas. Riquíssima em recursos naturais e animais, uma vez que 90% das espécies de plantas e animais são únicos no mundo inteiro, devido ao isolamento e separação da ilha da África e da Índia, há 165 milhões de anos, criando várias áreas restritas de biodiversidade desprotegida. Se em termos de flora, como é o caso das multiseculares e altíssimas pau-rosa e das famosíssimas “baobabs”, além de preciosas plantas medicinais e odoríficas, como baunilha, fértil em regiões como Antalaha, no litoral nordeste, que foi uma das principais exportações e riqueza da ilha, mas que, devido ao aumento da produção mundial, os preços sossobraram; no domínio da fauna, além de ser local dos famosos lémures (cujo nome significa espírito de Deus), onde existem 20 espécies, nomeadamente a sitaka sedosa, em vias de extinção; em termos de répteis, numa população de 99%, 373 espécies são igualmente endémicas, particularmente a harlequin mantella, restrita aos planaltos centrais e, no domínio das aves, nas suas gradualmente extintas florestas, predominam 108 espécies igualmente endémicas, e únicas da Ilha, como o camaleão e o mais minúsculo dos mamíferos, o rato-lémur. Mas não só! Com uma plataforma marítima supostamente rica em petróleo, solo riquíssimo em minerais, ouro, titânio, niquel e cobalto e pedras preciosas como safira, em que já foi 1/3 exportador mundial, para a sua extração, particularamente clandestina, destroem-se preciosas florestas. Se no abate clandestino, por gangues organizados das árvores pau-rosa, tipo de madeira considerada luxo na China, seu principal mercado, que só em 2009, com a derrocada do governo, importou clandestinamente mais de 300 milhões de euros deste tipo de madeira, nas florestas do nordeste onde foram abatidas diariamente preciosas e antiquíssimas árvores, no valor de 700 mil euros, destruindo uma área de 61,750 hectares, principalmente no Parque Nacional de Masoala, no litoral nordeste da ilha, atividade só largamente possível a uma rede de corruptos guardas florestais. A extração de níquel e cobalto, quando desregrada, e sem possibilidades de vigilância estatal adequada, como acontece em Ambatovy, na zona central oriental, não só prejudica a destruição de preciosa floresta tropical como provoca a perniciosa erosão. E, se tudo isto não bastasse, uma população faminta, que além do abate clandestino das árvores pau-rosa, procura outros meios como a extração clandestina de minerais, especialmente pedras preciosas, tão procuradas por especuladores do mercado asiático, nomeadamente no Sri Lanka e na Tailândia, bem como o abate clandestino dos raros e cada vez mais extintos lémures, iguaria em guisados dos retaurantes tanto da capital, Antananarivo, como da China.

De origens árabes e composta por vários reinados, segundo navegadores portugueses no seu litoral, principalmente na zona norte, proliferavam povoações dominadas por arquitetura semelhante à de Kiwa, atualmente na Tanzania, antigo e importante entreposto comercial. Julga-se que faziam parte de uma rede de comércio árabe. Este, particularmente o caso de Vohemar, centro comercial da ilha, modelo original das tradições artesanais malgachi e afro-árabe. Compreende-se a cobiça dos navegadores portugueses que à costa abordaram e, até navegaram rio acima do Matitana, na costa ocidental do sudoeste, para, naturalmente, pilharem, obviamente contra a oposiçao da população, dentre ela descendentes de mouros de Malinde. (Melinde, onde Vasco da Gama se reabasteceu, e “reformou” a 15 de Abril de 1498 – Lusíadas Canto II, 57-58,70, 73,94 e X-39,96). De colónia francesa, Madagáscar adquiriu a independência em 26 de Junho de 1960 sob a presidência de Tsiranana que governou o país até a 1972. Sujeita a várias crises, com consequentes perdões de dívida e de investimento, procura aproximar-se da África do Sul em termos de desenvolvimento. Devido a dirigentes corruptos, como foi o caso do Presidente Marc Ravalomanana, que ganhando as eleições a pretexto de inúmeras e necessárias reformas, encheu o bolso e, perante uma população faminta e revoltada que assomou aos portões do palácio, em 7 de Fevereiro de 2009, foi recebida a tiro, fazendo 30 vítimas mortais. Este incidente cultminou com a sua demissão pelos militares, refugiando-se na Suazilândia.