quarta-feira, 7 de outubro de 2009

A Tragédia de Samoa

Sábado, 3 de Outubro de 2009
Contrastes do vasto Oceano Pacífico (Sul) – as ilhas de Anuca e da Páscoa
Com a tragédia da Samoa nas parangonas internacionais e cujo rescaldo, pelo menos em número de vidas ainda por averiguar, debrucemo-nos no Pacífico. O Oceano Pacífico, um dos mais vastos e profundos mares do Sistema Terrestre, é semeado por 22.000 ilhas que se caracterizam pelo seu invulgar beleza, mas enorme isolamento. O contraste entre elas não podia ser maior. Concentremo-nos, apenas em duas – a minúscula Anuta (parte do arquipélago-estado das Ilhas de Salomão), e o vasto arquipélago conhecido por Ilha da Páscoa.
A primeira, caracterizada pela comunidade e unidade dos seus escassos 250 habitantes, numa superfície de apenas 400 metros de largura, praticamente circular, dominada pela colina Maunga Hill, de 65 metros de altura, no norte da ilha. Situada no sudeste do arquipélago e a cerca de 450 km leste da ilha de Santa Cruz, a vizinha ilha fica a cerca de 130km.
Os seus habitantes, praticamente descendentes, da mesma raíz e etnia polinésia (a contrastar com os conterrâneos das Ilhas de Salomão, que são melanésios), formam a família ideal e até única no mundo inteiro. Tanto a escassa superfície como, mas muito principalmente, os reduzidos recursos, constituem a razão principal da sua unidade e existência. Cultivando os seus páteos com esmero e o exíguo espaço com diligência em agricultura rotativa, responsabilidade de cada família, não só para sustento próprio, como para a comunidade em geral, dependem dos escassos frutos e raízes, nomeadamente taro, fruto raro e delicado encontrado só na ilha, bananas, papaia e mandioca, bem como, mas muito principalmente, da abundante pesca. Porém, e graças à abundância de coco, dele depende como bebida e, da fibra, preparam refeições, enquanto a casca serve de copos e as folhas de telhas e também para a confecção de cestos. Afectados por tempestades constantes, nomeadamente ciclones como o Zoe, que assolou a ilha em 2003 e destruíu praticamente toda a produçã, compreende-se a filosofia predominante que é o partilhar dos haveres pessoais, acto chamado Aropa, símbolo de preocupação e compaixão por todos e cada um.
O primeiro registo desta notável ilha remonta a 1791 e, os primeiros missionários anglicanos, chegaram em 1916. Desde então, a igreja desempenha papel importante na vida e bem-estar de Anuta, com serviços religiosos duas vezes por dia. É esta dependência e simbiose que faz com que a igreja seja a verdadeira protectora, com a invulgar responsabilidade de proteger os seus habitantes de epidemias, secas e até desastres naturais! Mas não obstante a influência cristã, que substituíu o papel dos chefes tribais, a tradição desempenha papel importante na população, que não desconta a influência dos seus chefes como líderes espirituais, de quem também depende o futuro do seu povo. Futuro, ainda arraigado em tabus e rituais, como a cabeça, que é considerada sagrada e os pés tidos como profanos. Não surpreende que quando visitam o chefe, na sua cabana, rastejam e não se põem de pé, pois caso ultrapassem a sua altura, é considerado como mau presságio. E, como acto fraternal, em vez de um beijo ou abraço, esfregam nariz com nariz, também uma saudação típica entre os polinésios, a cuja raça pertencem. Mas para o chefe o tratamento é diferente: o nariz é dirigido ao seu joelho!
Embora desde então visitada ocasionalmente por embarcações, o único e garantido contacto com o mundo exterior é o barco cargueiro proveniente de Honiara, capital do país. Mas devido às constantes intempéries que afectam a região, a regularidade destas visitas não existe.
Peritos no comportamento das marés, os pescadores são detentores de únicas técnicas de pesca para a qual construem e usam embarcações características, aliás fruto de séculos. Dependendo principalmente das estrelas, colocando a proa das embarcações em direcção de uma sucessão estelar, na rara falta delas, orientam-se também pelas núvens e pea direcção das ondas. Os pescaderes são os únicos que ganham dinheiro e o seu principal objectivo é a apanha de tubarões cujas abanas secam para consumo e vendem a carne ou às embarcações que ali arribam ou nas viagens que fazem para a capital, Honiara. Outros, ampliam os seus rendimentos, trabalhando temporariamente na capital.
ILHA DA PÁSCOA
A contrastar tanto ao tamanho, características, mas especialmente a história da ilha de Anuta, está a Ilha da Páscoa, ou Rapa Nui. Igualmente situada e sudeste do Oceano Pacífico, mas no chamado Triângulo Polinésio, esta remota ilha, de origem e geologia vulcânica é território especial do Chile, caracterizada pelas enormes estátuas megalíticas, chamadas muai, é catalogada pela ONU como Património Mundial. Com a superfície de 163,6 km2 e a população de 3791 pessoas, tem como capital Hanga Roa. Situada a 3516 km do Chile, é actualmente uma das mais isoladas ilhas habitadas. A sua história, porém, é de destruição e extirpação dos seus habitantes, que devido a rivalidades, se auto-destruíram.
Nome atribuído pelo seu descobridor, o holandês Jacob Roggeveen, quano ali abordou no Domingo de Páscoa de 1722. O nome actual polinésio de Rapa Nui, ou Rapa Grande, reflecte a preferência dos nativos primitivos, aliás confirmado pelo navegador sueco Thor Ayerdahl
A história da Ilha da Páscoa é rica e controversa, como misteriosa. Os seus habitantes primitivos enfrentaram fomes, epidemias, guerra cívil, assaltos de escravatura e colonialismo. E, a culmatar, a derrocada de ecosistema, principamente devido à deforestação.
A data dos primeiros habitantes, semelhante à das ilhas do Hawai, remonta a 300-400. Mas há discordâncias, pelo que segundo alguns historiadores, a data inicial pode situar-se a 700-800. Populada por etnia polinésia, que para ali aportou em canoas, proveniente das ilhas Marquise, a cerca de 3200km de distância, ou possivelmente das ilhas Tuamotou ou ainda de Pitcairn, a respectivamente 2600 e 2000km de distância. A provar esta hipótese, em 1999 foi feita uma reconstituição de barcos polinésios primitivos entre a Ilha de Páscoa e a de Mangareva, em 17 dias.
Segundo a lenda, registada por missionários nos anos 1860, a ilha era originalmente dominada por um sistema distinto de classe, com um ariki, ou rei, com poder absoluto, desde que os lendários Hotu Matua, inicialmente aportaram à ilha, como é evidente nas enormes e massiças estátuas erguidas e espalhadas pelo litoral, conhecidas por moai, como prova da sua crença, cultura homogénica e sistema de governo. Por razões desconhecidas, de um golpe militar, denominado matatoa, resultou um novo culto baseado no deus excepcional Makemake. A este culto, e particularmemte ao seu sacerdote Tangata Manu, é atribuída a miséria que assolou a ilha no final do século XIII e início do XIX, com a predominância da quebra do ecosistema, danificando as culturas resultando numa fome gradual que provocou doenças e a morte.
Segundo narrativas de 1722 e 1770, as estátuas – 877 na totalidade - eram a única evidência da existência daquela civilização, mas aquando da visita do Capitão Cook, em 1774, muitas delas estavam caídas, resultante das guerras intestinas, particularmente em 1830. Em 1838, a única ainda em pé, encontrava-se nas esfaldas de Rano Raraku e Hoa Hakananaiºa, em Orongo.
Uma série sucessiva de acontecimentos matou e removeu quase toda a população da Ilha, em 1860. A começar por piratas peruvianos, em Dezembro de 1862, com o objectivo de captar pessoas como escravos, estes actos continuaram durante vários meses capturando e matando cerca de 1500 homens e mulheres, cerca de metade da população. Porém, escasso número conseguiu regressar, mas devido a um ataque de varíola, que resultou numa epidemia, deu-se a devastação final da população em que algumas pessoas nem chegaram a ser sepultadas. Aquelas que resistiram, sucumbiram devido à luta entre clans rivais a fim de se apoderarem das terras e propriedades dos mortos, resultando em mais fomes e miséria. E, a agravar a periclitante situação, o primeiro missionário cristão a abordar à ilha, Eugène Eyraud, trouxe com ele a dádiva da tuberculose, em 1867, ceifando um quarto da restante população de 1200 habitantes.
A Ilha da Páscoa foi anexada pelo Chile, em 9 de Setembro de 1888, por Policarpo Toro, por Tratado de Anexação, assinado pelo governo do Chile e a população Rapanui. Até aos anos 1960 os sobreviventes estavam confinados ao acampamento de Hanga Roa, e o resto da ilha alugado à empresa Williamson-Balfour, como herdade de ovinos, até 1953. A ilha passou a ser gerida pela Marinha chilena até 1966, sendo a partir daí reaberta e ao povo Rapanui garantida a cidadania chilena. Em Julho de 2007, a reforma constitucional garantiu à ilha, juntamente às ilhas Juan Fernandez, o estatuto de Territórios Especiais. Dependendo de édito confirmação presidencial, a ilha continuará a ser governada como parte da Região de Valparaíso.
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Etiquetas: Geografia - Anuta e Ilhas da Pascoa

sábado, 3 de outubro de 2009

Contrastes do vasto Oceano Pacífico (Sul) – as ilhas de Anuca e da Páscoa

Com a tragédia da Samoa nas parangonas internacionais e cujo rescaldo, pelo menos em número de vidas ainda por averiguar, debrucemo-nos no Pacífico. O Oceano Pacífico, um dos mais vastos e profundos mares do Sistema Terrestre, é semeado por 22.000 ilhas que se caracterizam pelo seu invulgar beleza, mas enorme isolamento. O contraste entre elas não podia ser maior. Concentremo-nos, apenas em duas – a minúscula Anuta (parte do arquipélago-estado das Ilhas de Salomão), e o vasto arquipélago conhecido por Ilha da Páscoa.
A primeira, caracterizada pela comunidade e unidade dos seus escassos 250 habitantes, numa superfície de apenas 400 metros de largura, praticamente circular, dominada pela colina Maunga Hill, de 65 metros de altura, no norte da ilha. Situada no sudeste do arquipélago e a cerca de 450 km leste da ilha de Santa Cruz, a vizinha ilha fica a cerca de 130km.
Os seus habitantes, praticamente descendentes, da mesma raíz e etnia polinésia (a contrastar com os conterrâneos das Ilhas de Salomão, que são melanésios), formam a família ideal e até única no mundo inteiro. Tanto a escassa superfície como, mas muito principalmente, os reduzidos recursos, constituem a razão principal da sua unidade e existência. Cultivando os seus páteos com esmero e o exíguo espaço com diligência em agricultura rotativa, responsabilidade de cada família, não só para sustento próprio, como para a comunidade em geral, dependem dos escassos frutos e raízes, nomeadamente taro, fruto raro e delicado encontrado só na ilha, bananas, papaia e mandioca, bem como, mas muito principalmente, da abundante pesca. Porém, e graças à abundância de coco, dele depende como bebida e, da fibra, preparam refeições, enquanto a casca serve de copos e as folhas de telhas e também para a confecção de cestos. Afectados por tempestades constantes, nomeadamente ciclones como o Zoe, que assolou a ilha em 2003 e destruíu praticamente toda a produçã, compreende-se a filosofia predominante que é o partilhar dos haveres pessoais, acto chamado Aropa, símbolo de preocupação e compaixão por todos e cada um.
O primeiro registo desta notável ilha remonta a 1791 e, os primeiros missionários anglicanos, chegaram em 1916. Desde então, a igreja desempenha papel importante na vida e bem-estar de Anuta, com serviços religiosos duas vezes por dia. É esta dependência e simbiose que faz com que a igreja seja a verdadeira protectora, com a invulgar responsabilidade de proteger os seus habitantes de epidemias, secas e até desastres naturais! Mas não obstante a influência cristã, que substituíu o papel dos chefes tribais, a tradição desempenha papel importante na população, que não desconta a influência dos seus chefes como líderes espirituais, de quem também depende o futuro do seu povo. Futuro, ainda arraigado em tabus e rituais, como a cabeça, que é considerada sagrada e os pés tidos como profanos. Não surpreende que quando visitam o chefe, na sua cabana, rastejam e não se põem de pé, pois caso ultrapassem a sua altura, é considerado como mau presságio. E, como acto fraternal, em vez de um beijo ou abraço, esfregam nariz com nariz, também uma saudação típica entre os polinésios, a cuja raça pertencem. Mas para o chefe o tratamento é diferente: o nariz é dirigido ao seu joelho!
Embora desde então visitada ocasionalmente por embarcações, o único e garantido contacto com o mundo exterior é o barco cargueiro proveniente de Honiara, capital do país. Mas devido às constantes intempéries que afectam a região, a regularidade destas visitas não existe.
Peritos no comportamento das marés, os pescadores são detentores de únicas técnicas de pesca para a qual construem e usam embarcações características, aliás fruto de séculos. Dependendo principalmente das estrelas, colocando a proa das embarcações em direcção de uma sucessão estelar, na rara falta delas, orientam-se também pelas núvens e pea direcção das ondas. Os pescaderes são os únicos que ganham dinheiro e o seu principal objectivo é a apanha de tubarões cujas abanas secam para consumo e vendem a carne ou às embarcações que ali arribam ou nas viagens que fazem para a capital, Honiara. Outros, ampliam os seus rendimentos, trabalhando temporariamente na capital.
ILHA DA PÁSCOA
A contrastar tanto ao tamanho, características, mas especialmente a história da ilha de Anuta, está a Ilha da Páscoa, ou Rapa Nui. Igualmente situada e sudeste do Oceano Pacífico, mas no chamado Triângulo Polinésio, esta remota ilha, de origem e geologia vulcânica é território especial do Chile, caracterizada pelas enormes estátuas megalíticas, chamadas muai, é catalogada pela ONU como Património Mundial. Com a superfície de 163,6 km2 e a população de 3791 pessoas, tem como capital Hanga Roa. Situada a 3516 km do Chile, é actualmente uma das mais isoladas ilhas habitadas. A sua história, porém, é de destruição e extirpação dos seus habitantes, que devido a rivalidades, se auto-destruíram.
Nome atribuído pelo seu descobridor, o holandês Jacob Roggeveen, quano ali abordou no Domingo de Páscoa de 1722. O nome actual polinésio de Rapa Nui, ou Rapa Grande, reflecte a preferência dos nativos primitivos, aliás confirmado pelo navegador sueco Thor Ayerdahl
A história da Ilha da Páscoa é rica e controversa, como misteriosa. Os seus habitantes primitivos enfrentaram fomes, epidemias, guerra cívil, assaltos de escravatura e colonialismo. E, a culmatar, a derrocada de ecosistema, principamente devido à deforestação.
A data dos primeiros habitantes, semelhante à das ilhas do Hawai, remonta a 300-400. Mas há discordâncias, pelo que segundo alguns historiadores, a data inicial pode situar-se a 700-800. Populada por etnia polinésia, que para ali aportou em canoas, proveniente das ilhas Marquise, a cerca de 3200km de distância, ou possivelmente das ilhas Tuamotou ou ainda de Pitcairn, a respectivamente 2600 e 2000km de distância. A provar esta hipótese, em 1999 foi feita uma reconstituição de barcos polinésios primitivos entre a Ilha de Páscoa e a de Mangareva, em 17 dias.
Segundo a lenda, registada por missionários nos anos 1860, a ilha era originalmente dominada por um sistema distinto de classe, com um ariki, ou rei, com poder absoluto, desde que os lendários Hotu Matua, inicialmente aportaram à ilha, como é evidente nas enormes e massiças estátuas erguidas e espalhadas pelo litoral, conhecidas por moai, como prova da sua crença, cultura homogénica e sistema de governo. Por razões desconhecidas, de um golpe militar, denominado matatoa, resultou um novo culto baseado no deus excepcional Makemake. A este culto, e particularmemte ao seu sacerdote Tangata Manu, é atribuída a miséria que assolou a ilha no final do século XIII e início do XIX, com a predominância da quebra do ecosistema, danificando as culturas resultando numa fome gradual que provocou doenças e a morte.
Segundo narrativas de 1722 e 1770, as estátuas – 877 na totalidade - eram a única evidência da existência daquela civilização, mas aquando da visita do Capitão Cook, em 1774, muitas delas estavam caídas, resultante das guerras intestinas, particularmente em 1830. Em 1838, a única ainda em pé, encontrava-se nas esfaldas de Rano Raraku e Hoa Hakananaiºa, em Orongo.
Uma série sucessiva de acontecimentos matou e removeu quase toda a população da Ilha, em 1860. A começar por piratas peruvianos, em Dezembro de 1862, com o objectivo de captar pessoas como escravos, estes actos continuaram durante vários meses capturando e matando cerca de 1500 homens e mulheres, cerca de metade da população. Porém, escasso número conseguiu regressar, mas devido a um ataque de varíola, que resultou numa epidemia, deu-se a devastação final da população em que algumas pessoas nem chegaram a ser sepultadas. Aquelas que resistiram, sucumbiram devido à luta entre clans rivais a fim de se apoderarem das terras e propriedades dos mortos, resultando em mais fomes e miséria. E, a agravar a periclitante situação, o primeiro missionário cristão a abordar à ilha, Eugène Eyraud, trouxe com ele a dádiva da tuberculose, em 1867, ceifando um quarto da restante população de 1200 habitantes.
A Ilha da Páscoa foi anexada pelo Chile, em 9 de Setembro de 1888, por Policarpo Toro, por Tratado de Anexação, assinado pelo governo do Chile e a população Rapanui. Até aos anos 1960 os sobreviventes estavam confinados ao acampamento de Hanga Roa, e o resto da ilha alugado à empresa Williamson-Balfour, como herdade de ovinos, até 1953. A ilha passou a ser gerida pela Marinha chilena até 1966, sendo a partir daí reaberta e ao povo Rapanui garantida a cidadania chilena. Em Julho de 2007, a reforma constitucional garantiu à ilha, juntamente às ilhas Juan Fernandez, o estatuto de Territórios Especiais. Dependendo de édito confirmação presidencial, a ilha continuará a ser governada como parte da Região de Valparaíso.