sexta-feira, 30 de setembro de 2011

ÁGUA “SEIVA DO NOSSO PLANETA”

Ao passar, várias vezes, principalmente no verão, tanto pelo Rio Dão, bem como visitar o saudoso Dinha da infância, ou atravessar, neste caso de carro, o Mondego, dos quais depende a irrigação e a verdura dos campos que atravessam, qual não é o pesar ao vê-los reduzidos, a pouco mais, na melhor das hipóteses, de um pobre ribeiro. Semelhante sentimento, mas este pior, foi ao visitar a bela Lagoa Azul, na Serra de Sintra, em Janeiro de um já remoto ano, e vê-la completamente seca! Ainda que, com a excepção, desta última, tudo dependa da época do ano, facto é que, devido às mudanças climáticas, a água dos rios ou os recursos aquáticos mundiais estão perigosamente a desaparecer. Quando, segundo o historiador religioso, Mircea Eliade, escrevendo em 1950, afirmava que “as nascentes de água são a origem de toda a nossa existência”, e segundo o artigo 2 da Declaração Universal dos Direitos da Água, “a Seiva do Nosso Planeta”, os Babilónios insistiam que o mundo era formado da mistura de água doce com água salgada; os Índios Pima criam que a Terra-Mãe era emprenhada pela água, e o psicólogo Carl Jung afirmava “que sem água ninguém pode viver”, está-se perante uma invulgar tragédia humana. Se, como vimos, da água depende a nossa existência, a ameaça da sua escassês é um verdadeiro pesadelo! Este, aliás, o louvável tema recente de um seminário, intitulado “Aqua Nostra”, realizado nesta cidade pelo Rotary Club de Tondela. Num Planeta como o nosso, coberto de água, mas que 97% é salínica e cerca de 2% está transformada em gelo, resta apenas menos de 1% para a irrigação da agricultura, o arrefecimento das centrais elétricas, como se tem bem presente a luta titânica na central nuclear de Fukuxima, no norte do Japão, para impedir uma catástrofe nuclear, bem como para o consumo doméstico. Com a população mundial atualmente em 6 biliões, 850 milhões e 500 mil e com o aumento anual de 83 milhões, a crise da escassês mais se agrava, quando já é negríssimo o cenário actual: calcula-se que 1,1 bilião de pessoas vive sem água potável, 2,6 biliões sem condições sanitárias, 1,8 milhões morrem de diarreia e 3,900 crianças perecem diariamente resultante de doenças relacionadas com a água ou falta dela. E, infelizmente os exemplos são inúmeros!

Os gelos do Himalaia, que alimentam quatro dos mais poderosos caudais mundiais – Yangtzé, Amarelo, Mekong e Ganges - nomeadamente as montanhas mais altas de Kawagebo, a 6, 600 metros de altitude, as principais nascentes destes poderosos rios, entre Agosto de 1921 e Outubro de 2008 perderam 10,5 metros verticais de gelo, com o maior índice de agravamento entre os últimos 50 anos em que não se tem verificado a habitual compensação sasonal de gelo. Nesta zona, classificada pelo glaciologista da Universidade do Estado de Ohio, Lonnie Thompson, de “banco da água doce de que depende toda a Ásia”, a situação é crítica. Isto significa que caso esta tendência se mantenha, toda a vastíssima zona do sudeste asiático, que destas águas depende, está em risco de trágica e permanente seca. Outras zonas, como a bacia dos rios Murray-Darling, no sul da Austrália, até agora celeiro do país e de criação de gado, devido à invulgar e longa seca, está a afastar o vasto número de agricultores que dela dependiam. Isto, não obstante as recentes e devastadoras inundações! Outro exemplo semelhante é o Peru e o Equador. No vasto nordeste do Perú e sul do último, numa superfície de 2,250 km2 estende-se o Deserto Piura, centro de vasta espécie de cactos e outra vegetação endémica. Dependendo das vagarias do perigoso El Nino, e de umas escassas gotas de chuva, o normal é a aridês e a contínua seca o que provoca a fuga das desgraçadas populações à procura de escassos pastos para os debelitados rebanhos. Compreende-se porque o Equador foi o primeiro país do mundo a incluír na sua Constituição os direitos da natureza a fim de que os rios e as florestas não exerçam apenas funções de propriedade, mas seja-lhes outorgado o direito de prosperar. Situação idêntica acontece na Etiópia, cuja população, em maioria mulheres, gasta horas e horas, na média seis por dia, para, normalmente, com uma colher de pau, obter um cântaro de água impura para suster a família, já que é inexistente para banhos ou outras carências higiénicas básicas! Na realidade, enquanto 46% da população mundial não dispõe de água canalizada nas suas habitações e os habitantes mais pobres não dispõem de 20 litros de água, a população americana desperdiça, diariamente, 400 litros deste precioso líquido. Efetivamente, enquanto a população da Califórnia conta com a maior rede mundial de canalização de água – 1,660km – dentre os quais o Aqueduto da Califórnia, de 710km de extensão, noutros pontos do Globo, nomeadamente no Próximo Oriente – Israel, Palestina, Jordânia, Iraque e Síria - a escassês deste precioso líquido, e a sua retenção ou desvio, principalmente por parte de Israel, representa uma ameaça constante de Guerra. Em todo este cenário, meditemos nesta curiosidade: Dos 1.260.000.000.000.000.000.000 litros de água que existem no nosso planeta, 290.000.000.000 são diariamente consumidos pela companhia Coca Cola, que vende 1,5 biliões de refrigerantes por dia, em 200 paises (dados de 2006).

Nota: A União Europeia publicou um relatório sobre a escassês da água em 18 e Maio de 2010
Agradecimento, e maioria dos dados, a National Geographic (edição de Abril de 2010 em Inglês).

domingo, 25 de setembro de 2011

A OCULTA FACETA DO ROMANCISTA E DRAMATURGO SOMERSET MAUGHAM

Embora quase durante 60 anos fosse um dos mais aclamados e famosos escritores em todo o mundo e o seu apogeu literário-teatral mundial predominasse nos anos 40 e 50, com a maioria das suas obras, (21 romances e 100 novelas) traduzidas em centenas de línguas, incluindo o Português e parte do panteão dos clássicos, William (mais conhecido por Willie) Somerset Maugham (1874-1965), é de novo lembrado, com a publicação de uma extensa biografia (*), com a particularidade de elementos nunca divulgados. Trabalho meticuloso e exaustivo da escritora-jornalista britânica, Selina Hastings, o leitor-admirador de Maugham, encontra nesta obra revelações, muitas delas chocantes, particularmente naquilo em que o brilhante autor-dramaturgo procurou, ao longo da sua longa vida, ocultar – a sua homosexualidade e, não só. Como a biógrafa assinala, “mestre do disfarce”, cujo biombo matrimonial com Syrie Welcome (filha do célebre médico autor da Fundação do mesmo nome) ocultou uma depravada sexualidade aos olhos do mundo e cujo desastroso relacionamento provocou a diversão em inúmeras viagens, embora das quais recolheria múltipla matéria para temas literários e teatrais. Dominado pelas letras, às quais religiosamente dedicaria as manhãs ao longo da sua longa vida, particularmente na sua bela vivenda Mauresque, em Biarritz, Somerset Maugham é, finalmente, desmascarado.
Interrogado em 1955, aos 81 anos de idade, se desejaria ver-se biografado, respondeu, dismissivamente, que “as vidas dos escritores modernos não têm qualquer interesse, e a minha, por ser insípida, não gostaria de vê-la associada a coisas dissaboridas”. Tinha boas razões. Não pela alegada vida insípida, mas pelo que, a todo o custo, queria ocultar. Antes, o sobrinho, Robin Maugham, o quis fazer. Quando lhe participou as suas intenções e que, para tal, já lhe fora adiantado a participação dos direitos, qual não foi o esforço do escritor, principalmente com a editora, em dissuadi-la do projeto, enquanto ao sobrinho pagou a então vasta fortuna que receberia pelo seu trabalho. Já no limiar da longa vida, mudou de ideias. Mais por convencimento e, acima de tudo, lucro do segundo e mais fiel amante, Alan Searle, juntamente por insistência do astuto magnate de imprensa, Lord Braverbrook, que queria, como conseguiu, serializar as suas memórias (Setembro e Outubro de 1962), e também por considerar ser melhor ele fazê-lo, esta experiência ser-lhe-ia altamente prejudicial, tanto ao seu enorme prestígio como, mas muito especialmente, à
sua já débil saúde, apressando até a morte. Ao escrever o que intitulou “Looking Back” (Memórias do Passado), das quais Alan receberia embora modesta quantia de Beaverbrook em relação à então fortuna, 1/4 de milhão de dólares, da revista Show americana, ao fazer revelações até então íntimas de amigos e de figuras influentes da época, Maugham pagaria caro. No fim da obra, o autor ao admitir ser “uma criatura muito imperfeita e atormentada” e adianta que “ao escrever [as memórias] fi-lo para desfazer-me de pesadelos que muitas vezes me obrigaram a noites sem dormir”. As reações foram intensas e inesperadas. Não só e principalmente à qualidade do trabalho, que deslustrava uma imagem literária incólume, mas, acima de tudo, a senelidade e o estado mental do autor. Escritores amigos como o prestigiado Noel Coward (1899-1973) não se contiveram. Para este último, trata-se de “altamente ultrajante” e um “trabalho senil e escandaloso”, Para outro, como Grahame Greene (1904-1991), Maugham, não passava de “um obsceno e vil sapo”, (ou seja), pessoa detestável. P ara outro escritor e amigo, Gore Vidal, referindo-se à venerada imagem criada pelo romancista-dramaturgo, “o velho Maugham minou o seu próprio monumento, fazendo-o explodir” . Desprezado e humilhado, o autor, profundamente desolado, lamentando e chorando, fechou-se por completo, refugiando-se no seu chalé, do sul da França, para nunca mais voltar à Inglaterra, o país que igualmente, como patriota, serviu e muito contribuíu em missões secretas nas duas grandes guerras, mas especialmente na segunda, tanto na Rússia e na França como, e muito principalmente, nos Estados Unidos, onde desempenhou importante papel a favor do auxílio daquele país e povo ao sacrificado e heroico povo britânico, contribuindo, enormemente, para a sua adesão e a consequente vitória aliada.
(*) The Secret Lives of Somerset Maughan, de autoria de Selina Hastings. Editora John Murray (Londres)

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

A GRANDE E SURREPTÍCIA INVASÃO ISLÂMICA

CAROS AMIGOS BLOGUISTAS,

Depois de uma longa ausência no nosso querido e rejuvanescido país, cujas experiências serão assunto de um próximo artigo, aqui estou, com um grande abraço, para partilhar o prazer da vossa sempre amável companhia! O melhor para todos.


Nas últimas décadas, mais por razões económicas, devido à massa migratória, e, mais recentemente, provocadas pelas consulsões no Mundo Árabe, a Europa, subitamente, acordou à nova Invasão Mussulmana. Como se sabe, desde a Primeira, liderada por Tarik ibn Ziyad (nome que deriva de Jabal Tarik – Montanha de Tarik), que capturou a Península Ibérica, em 711 AD, e que, em corruptela, resultou no nome de Gibraltar, a dominarem até ao período dos chamadoss reis Católicos, Isabel e Ferdinand de Castela (1451-1504), a quem se deve a expulsão do último reduto mussulmano, até então radicado em Sevilha e Córdova, califado fundado por Abd-ar-Rahman I, em 756AD. Aliás, a este casal real, e especialmente ao seu fervor católico, leia-se, fanatismo, devem-se, igualmente, duas das grandes manchas da História – a Inquisição e a Expulsão dos Judeus, em 1478. Radicados à tão cobiçada África pelos Europeus, os Mussulmanos, inicialmente apenas de origem árabe, acomodoram-se e praticamente ali permaneceram ignorados. Salvo a cultura e raro acervo literário de Timbuktu, no actual Mali, fundada no século XI, um povo praticamente nómada, só de novo lhe foi prestada atenção nos finais do século XIX, devido ao petróleo, e este inicialmente na atual Arábia Saudita. Ironicamente, é neste país que historiamente tem origem a Civilização Mussulmana, ou Islâmica. E, se Islamismo é um termo puramente religioso, que o Al Corão define por

devoção ou submissão a Deus, mussulmanismo (raíz etimológica do árabe moslin + persa an) é gentílico, embora hoje sejam indistintos. De acordo tanto com a tradição mussulmana, como com a historiologia moderna, o Islão teve origem na Arábia, ou Najd (actualmente Arábia Saudita). Para os mussulmanos, o islamismo teve início não com Maomé, mas com Abraão e seu filho Ismael, este o progenitor dos Árabes, com a edificação de Ka'ba, em Meca, centro de peregrinação anual dos fieis, (geralmente em meados de Novembro) situada na vasta região ocidental, conhecida por Hijaz. Como se sabe igualmente, foi ali que Maomé nasceu, em 570, oriundo da tribo menor Quaryash. Cedo órfão, em 610, aos 40 anos de idade, e, quando casado com a rica mentora Khadija, 15 anos mais velha que ele, começou a ter revelações, num período de 23 anos, atribuídas ao Anjo da Revelação (Gabriel) como intermediário, as primeiras, quando se encontrava só, nas Caves de Hira, em 610, que o instruiu "Lê, no nome do teu Senhor!", ao qual replicou não saber ler. Depois de forçado, recitou as duas primeiras linhas, que, compiladas, mais tarde, dariam lugar ao Al Corão (que significa leitura/recitar), e que inicialmente partilhou com a família e amigos. Caberia a Abu Bakr a primeira compilação e, ao terceiro califa, 'Uthman, a distribuição pelo mundo islâmico, do que passaria a ser conhecido por Codex 'Uthmânico. Mensagem monoteísta, cedo enfrentou problemas com a cultura local, essencialmente politeísta, provocando tanto a sua fuga como a dos seus acólitos, em 622, para Yatrib, mais tarde conhecida por Madinat al-Nabi (cidade do Profeta), ou, simplesmente Madina (Medina), um oásis populado por Judeus onde se tornou indistinguível pelo facto de, como eles, reconhecerem os profetas bíblicos e, tal como as tribos locais, gozaram da mesma liberdade religiosa. Madina, seria o génesis do primeiro Estado mussulmano. Foi a emigração, que os mussulmanos chamaram hijra, que constituíu o início da carreira de Maomé como estadista e figura, para alguns, mas erroneamente, fundador da religião, que o levaria a ser considerado infalível, até à sua morte, em 632. Depois de várias dissenções e até guerras civis, particularmente devido à sucessão, ou califado, de Maomé, por um lado, aqueles que advogavam a sua morte como fim natural de uma Era (Xiítas), e, com ela, desvinculamento a obrigações financeiras; outros, preferindo dinastias, como a Umayyads (661-750), - Abu Bakr, 'Umar (reinado entre 634-44), 'Utman (r.e. 644-56) e 'Ali (r.e. 656/61), (Sunis), todos descendentes de Maomé, de sangue ou de casamento, a estes, deve-se o maior impulsionamento do Islamismo. Se inicialmente a maioria do povo árabe era nomádico e dedicado à pastoralícia, por natureza disperso em várias

tribos, quatro importantes fatores influíram na sua expansão: o camelo, como importante meio de deslocação e transporte nessa vasta região sem estradas; a dinastia Umayyad, com as várias conquistas e a unificação tanto devido à religião como, e muito importantemente, à adoção da língua árabe. Fenómeno extraordinário, o Islamismo espalhar-se-ia desde a Península Ibérica às Balcãs e à atual Viena, incluindo as Américas, Austrália, China e Indonésia, este o maior país mussulmano do mundo. Na Grã-Bretanha surge o fenómeno do elevado número de mulheres que se converte ao islamismo, em relação aos homens! Na totalidade, estima-se que existe um bilião de mussulmanos em todo o mundo, sendo a maioria

Suni. Porém, só no século XX e XXI é que os mussulmanos e, com eles o Islamismo, regressariam à Europa, como vimos, via Emigração, o que realmente continua, nas últimas semanas, via ilha de Lampedusa, na Itália..

Nota: Os interessados têm uma nova, recente e excelente edição do

Al-Corão, em duas versões paralelas na mesma página – Inglês