O mundo acordou ultimamente para o ressurgir da pirataria, principalmente depois do audacioso assalto, há três semanas, ao largo de Mombaça, no Quénia, por piratas somális, do navio-tanque gigante saudi, Sirius Star. Embora com bandeira de conveniência nigeriana, com a preciosa carga de petróleo no valor de 150 milhões de euros, esta grande embarcação - com 330 metros de comprimento, 300 mil toneladas de peso bruto e capacidade para transportar dois milhões de barris de crude, no seu conjunto, incluindo o valor do vaso marítimo, os piratas apoderaram-se de uma propriedade orçada em 350 milhões de euros sobre a qual contavam inicialmente estorquir 25 milhões de dólares, mas reduzido agora para 15 milhões. Dentre a tripulação encontram-se dois oficiais britânicos, Peter French e James Grady, que, na quarta feira passada comunicaram com o canal ITV1 da Televisão Britânica. Esclarecendo que se encontram bem informaram que o assalto, inesperado, fora rápido.
Num mundo já preocupado com actos terroristas, o último dos quais, na quinta-feira passada, em Mobai (antiga Bombaim) em que morreram pelo menos 101 pessoas e centenas de feridos, principalmente sem se saber onde e como surgem, este ataque naval, pela sua audácia, e em pleno mar alto, surpreendeu o mundo inteiro, particularmente comercial e marítimo, aumentando, assim, o risco mundial e particularmente devido às novas medidas de protecção a tomar. Por tudo isto, persiste o sério risco de outros elevados custos. Referimo-nos tanto ao da protecção marítima como dos prémios de seguro da carga e dos navios que a transportam, que forçosamente, para evitá-lo, os armadores terão de preferir outras rotas menos perigosas, que por serem mais longas, terão obviamente de se reflectir no preço do transporte e, consequentemente, no preço da carga nos respectivos mercados. Actualmente, cerca de 16.000 navios mercantes dependem deste curto itinerário através do Canal do Suez.
Este ataque, porém, não foi isolado. Se, durante o ano passado, segundo a TIME (11 de Agosto de 2008), houve 263 sequestros, tanto nas águas da Somália como da Nigéria, este ano, desde Janeiro, segundo a Agência Marítima Internacional, com sede em Kuala Lumpur, registaram-se 95 assédios de pirataria na zona. Deste total, 39 navios foram sequestrados. Se a maioria dos casos tenha sido resolvida a contento dos assaltantes, com o consequente pagamento de avultados e desconhecidos resgates, que segundo o Instituto de Relações Internacionais, vulgo Chatham House, notável instituição londrina, que estuda e debate focos de instabilidade internacional, são calculados entre 18 e 30 milhões de dólares, até ao momento em que escrevemos, excluindo o navio grego "MV Genius", mas com bandeira nigeriana, retido desde Setembro e resgatado na semana passada, 16 vasos marítimos permanecem ainda em poder dos assaltantes, incluindo 300 membros das respectivas embarcações, a aguardar solução. Dentre eles encontra-se o navio-tanque ucraniano, MV Faina, com o carregamento de armas e munições, incluindo 33 tanques da era soviética, assaltado em 25 de Setembro, mas recentemente resgatado por avultada, mas desconhecida quantia. Escassos dias depois, foi anunciada também pela Agência Marítima Internacional, a detenção, no Golfo Somáli de Aden, de três outros navios. Um registado em Hong Kong, com 36.000 toneladas de cereais destinados ao Irão e com a tripulação composta por 25 pessoas, o segundo um navio de pesca registado na Tailândia, e o terceiro de matrícula grega, com tripulações que totalizam 64 pessoas. Há dias, também, foi afundado, a 500 quilómetros do porto omenita de Salalah, no norte do Golfo de Aden, pela marinha indiana, um navio-mãe pirata (abastecedor dos atacantes), e oito assaltantes somális que se preparavam para tomar um luxuoso iate francês, foram detidos e aguardam julgamento no Quénia.
Não obstante a presença de patrulhas navais tanto britânicas (de que fazem parte os comandos especiais da SAS, que, na semana passada, também mataram três indivíduos identificados como piratas), como dinamarquesas, japonesas, francesas russas, e americanas (5ª Esquadra Naval destacada no Mediterrâneo), a situação parece insolúvel. Segundo o comodoro britânico da Marinha Real, Keith Winstanley, vice-comandante das Forças Marítimas Combinadas, estacionadas no Médio Oriente, e responsáveis pela protecção naval da região afectada, além dos piratas disporem de meios sofisticados e armados até aos dentes, bem como de meios logísticos e de comunicação de ponta, para as forças de segurança, é impossível estarem em todo o lado. Desabafando, afirmou que “os piratas deslocam-se com naturalidade e frequência a locais onde não nos encontramos. Se patrulhamos o Golfo de Aden, vão para Mogadisho e, se vamos para ali, voltam para o Golfo de Aden”.
Como se vê, esta invulgar actividade predomina no litoral da Somália, e numa zona marítima em que 90% do comércio marítimo internacional circula. Lembrêmos que a Somália é um país que desde 1991 se mantem sem governo, e Puntland é a zona-epicentro da explosão de pirataria. Abandonada à sorte de poderosos e bem armados gangues, se, como se sabe, a Somália era já conhecida sepultura de soldados americanos e alfobre de notáveis grupos terroristas aliados à Al-Qaeda, a quem se devem os assaltos simultâneos à bomba às embaixadas dos Estados Unidos da América (EUA), tanto no Quénia como na Tanzania, em Agosto de 1998, que as deixaram praticamente destruídas e que provocaram a morte de 224 pessoas. Além disso, devido à notória instabilidade no país, impossibilita as agências internacionais de assistência a ajudar a carecida população, composta por 200.000 refugiados, principalmente no acampamento de Daddad, a cerca de 100km sul da fronteira com o Quénia, com a agravante de, pelo menos, 5000 novos refugiados afluirem todas as semanas.
Com chefes de gangues-piratas poderosos, como Sugule Ali e Bile Vadani, a contactar e a negociar por meio de caríssimos telefones por satélite com os donos das suas preciosas presas, e a garantirem que não vão abdicar de tão precioso meio por ser o que afirmam, único meio de sobrevivência, esta nóvel actividade na Somália constitui um novo e importante desafio a todas as potências comerciais e, principalmente aos EUA, à União Europeia e, sem dúvida à própria NATO, que está a ponderar sobre meios de acção adequados.
A pirataria marítima, porém, tal como a prostituição, não é nova. Se filmes de piratas, como a bem sucedida série de Piratas das Caraíbas, em que o artista Johnny Depp é o principal protagonista, atraem inúmeros espectadores do mundo inteiro, já Homero e Cícero apontavam incidentes que envolviam tanto marinheiros gregos como romanos. E, se, mais tarde, os europeus ocidentais sucumbiram aos vikingos, monarcas como Isabel I da Inglaterra, frustrados pela predomância marítima espanhola arrolavam aventureiros para assaltar os navios daquele país com preciosas cargas, dentre eles, consta o pioneiro, também inglês, Edward (cognominado Blackbeard - o barba preta ) Teach, particularmente notável em 1716.
sábado, 13 de dezembro de 2008
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