Com a realização do referendo sobre a possível secessão do Norte, a partir deste domingo, caso, como tudo leva a crer, mais de três milhões de registados cidadãos do Sul, terão, este ano, um novo país e uma nova cidadania. A República do Sudão, esse enorme país africano, de 2,5 milhões de km2 de superfície, já conhecida por Núbia, cenário de flagelos e lutas, poderá ser desmembrada dando lugar a um novo Estado. Resultado, como em muitos casos, de lutas para a independência, o Sudão do Sul emerge depois de duas horríveis guerras civis, o mais longo conflito africano, com o saldo de dois milhões de vítimas. Aliado à vizinha região do Darfur, a noroeste, que tantas manchetes internacionais têm dominado nos últimos anos, particularmente pelas suas mais de 200,000 mortes e dois milhões de deslocados habitantes, o historial deste possível novo Estado é nobre e extraordinariamente notável. Se já em si, esta vasta região constituía uma verdadeira anomalia sócio-politico-geográfica em relação ao Norte, a sua independência é mais do que justificada. Separada do árido e mussulmano Norte por enormes montanhas, ao sul das quais predominam pântanos e florestas tropicais, com o fértil Rio Nilo a dividi-la em duas partes, leste-oeste, é uma região distinta e que, há muito, luta pela independência.
A República do Sudão, que até 1956 estava associada ao Egipto e cujo antigo historial intimamente ligado aos antigosFaraós, com a desvinculação colonial britânica, adquiriu a independência, uma conturbada independência, inicialmente chefiada militarmente pelo Presidente Jaafar Numeiri, que depois de graves conflitos com o sul, concordou na autonomia desta região em 1972, voltando a eclodir em 1983. A partir de 1989, um bem sucedido golpe militar levou ao poder o general Umar al-Bashir- eleito em 1996 e reeleito em 2000. Em Abril do ano passado voltou a ganhar eleições multipartidárias, as primeiras em 24 anos, cujo resultado foi fortemente contestado pelos partidos de oposição, alguns dos quais renunciaram a luta pelas alegadas infracções. Homem duro, a sua liderança tem gerado enormes controvérsias, incluindo acusações de genocídio pelo que é procurado pelas Nações Unidas a depor no tribunal Internacional de Haia, sendo acusado de crimes de guerra e contra a Humanidade, principalmente devido à sua alegada acção no Darfur. Porém, tem-se evadido à justiça, principalmente devido ao apoio de alguns países da União Africana, bem como da China. E, agora, à semelhança de outros ditadores como os Marcos das Filipinas, segundo WilkiLeaks, desviou para bancos britânicos, sem dúvida como prevenção, 11,5 biliões de euros! Após dois anos de conflito, surgiu, finalmente o Tratado de Paz, assinado em Janeiro de 2005, resultando num governo de união nacional, com o primeiro vice-presidente e principal dirigente do Sul, também antigo lutador do Movimento de Libertação do Povo do Sudão (SPLM), Salva Kiir Mayardit, que poderá surgir como o primeiro Presidente do novo Estado Independente.
Fértil em petróleo, a produzir meio milhão de barris por dia, o acordo só foi possível com a concessão dos proventos, partilhados entre as duas regiões, mas com as refinarias e mais valias no Norte! Com a independência, a situação poderá mudar e, daí, a razão do Norte tudo ter feito para atrasar a realização do referendo. Com um Sul cristão ou animista, que recusou a imposição nacional mussulmana da sharia, a campanha do referendo, que começou em Abril do ano passado, cedo começou a ser fortemente contestada por um Norte oposto à independência do Sul, uma vez que perde a principal fonte de rendimento. Despachos da agência noticiosa do Sudão do Sul, (SUNA), provam-no, incluindo o encerramento do semanário independente do sul Juba, pelo governo nacional. O referendo, para ser válido, tem de contar com 60% de eleitores registados, muitos dos quais se deslocaram propositadamente ao Sul, enquanto outros estão a regressar ao que poderá ser novo País. Por isso, segundo o The Sudan Tribune, em inglês, publicado em Paris, a União Europeia está a seguir, muito de perto, o decorrer das operações, bem como o próprio embaixador britânico, na capital do Sudão, Kartum, Nicholas Kay, que classifica o desenrolar das operações de “drama em grande escala”.
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