quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013
ESSE “FIEL AMIGO”, GADUS MORHUA - AMIZADE MÚTUA?
A recente decisão da instituição britânica de conservação piscatória, Marine Conservation Society, da retirada da ementa, ou consumo vigiado, de piscícolas em perigo, como a Sarda (peixe rico em oleaginosas, nomeadamente Omega3) da família Escombrídea, à qual o atum também pertence, devido aos excessos piscatórios, principalmente na Islândia e nas Ilhas Faraó, que colocou aquela bela espécie em perigo, prontificou-me relacioná-lo com o bacalhau, tão considerado por nós Portugueses como “FIEL AMIGO”. Antes, porém, esqueçamo-nos dos tão falados e temidos polifosfatos! Em termos de reciprocidade, seremos amigos dele? Pergunta que faço a todos nós, como questão refletiva. Não o dispensando das nossas mesas, nas mais variadas formas culinárias, em que nós Portugueses, assim como outros povos latinos e descendentes latino-americanos, particularmente nos excedemos, certamente que não o fazemos por mera amizade. Será que jamais pensámos nisso quando o saboreamos? A certa resposta é um rotundo NÃO!
O bacalhau, especialmente o do Atlântico Noroeste (Terra-Nova e Labrador), erroneamente chamado da Noruega, cujo nome se deve à exploração piscatória desse país e, talvez, ao facto de terem sido os vikings os primeiros a explorá-lo, e por nós mais consumido em seco e por tratamento salínico, é cientificamente conhecido por Gadus morhua. Contrariamente ao semelhante prato britânico, mas frito, acompanhado das indispensáveis e igualmente batatas fritas, ali conhecido pelo nome Cod, mas fresco, abunda e é apanhado em menor profundidade nas menos frias águas do Mar do Norte. De salientar que embora nos seja atribuída a pesca do bacalhau no século XV, o nosso conhecimento e consumo deve-se aos nossos amigos ingleses que no-lo introduziram, a troco do vinho do Porto! Como aponta o Capitão Marryat, na obra Peter Simple, "a razão dos Portugueses e os Ingleses serem bons amigos, deve-se ao facto de que nós não conseguimos vinho do Porto em mais lado nenhum", essa amizade, deve-se à iniciativa dos comerciantes que traziam bacalhau da Terra-Nova e que, em troca, recebiam vinho do Porto. Segundo esta versão, a origem do fiel amigo, deve-se não a nós portugueses, mas aos ingleses e, em particular, à firma pioneira, que mais se distinguiu nesse comércio, Hunt, Roope & Company, em 1654 e que, para isso, contava com instalações em Viana do Castelo e em Vila Nova de Gaia.
Deixemos, porém este contexto histórico, para nos concentrarmos no essencial – a NOSSA amizade com tão” FIEL AMIGO”. Ao devorá-lo, fazemo-lo por amizade ou por mero glutonismo, irrespetivamente da sua extinção como espécie? Certamente que nunca pensámos nisso! Daí, este meu alerta da inexistente amizade mútua! Embora, como espécie, segundo a Comissão Canadiana da Vida Animal Selvagem em Perigo (COSEWIC), a tivesse considerado, em 1998, como “vulnerável”, e, mais tarde, atribuída a categoria de “preocupação especial”, a World Wide Fund (WWF) seguiu-se-lhe, em 2000, colocando o bacalhau na lista de espécies em perigo. A Greenpeace Internacional, em 2010, colocou-o, à semelhança agora da sarda, na “lista vermelha” de piscícolas de consumo. Face a estes solenes avisos, não restam duvidas que o nosso “fiel amigo” CORRE SÉRIOS RISCOS de continuar a ser o favorito da nossa culinária! Principalmente devido aos novos e potentes arrastões, que apanhando o bacalhau a águas cada vez mais profundas, especialmente nas zonas de desova, não permite os desejáveis níveis de recuperação e gestão, problema que se agrava desde 2007, quando as quotas do bacalhau das nossas mesas oscilam entre as 23.000 toneladas/ano, ou seja cerca de metade dos stocks disponíveis! Esta situação prontifica-me outro, certamente novo caso de extinção para o/a estimado/a leitor(a), o do chamado Pombo Passageiro. Quando esta mui admirada ave, verdadeiro espetáculo do século XIX, cujas camadas constituíam assunto de admiração, principalmente na zona médio-oriental dos Estados Unidos da América. Dos múltiplos mil milhões destas aves, inicialmente cobiça da Tribo índia Séneca, que das suas caças, de sete em sete anos fazia festivais, com a sua industrialização e comercialização, principalmente graças ao desenvolvimento do transporte ferroviário, entre os estados de Milwaukee/Chicago/Filadélfia ao do rico consumidor novaiorquino cuja afluente população saboreava a carne de tão belas aves. Para corresponder à sua glutonice e em que apenas mil milhões de aves eram mortas num só ano, no Estado de Michigan, facilmente extinta dela só resta a embalsamada Marta, falecida em cativeiro, em 1914, aos 29 anos de idade, no Jardim Zoológico de Cincinatti,. Nas mesmas circunstâncias, qual o lugar de uma possível espécie extinta do nosso “fiel amigo” Gadus morhua? Aquário de Lisboa? É a vez de reciprocarmos a amizade deste nosso “Fiel Amigo”, evitando desregrada e impensavelmente devorá-lo!
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